“Wunderteam”, o esquadrão que colocou a Áustria no centro do futebol

Atualmente na 30ª colocação do ranking da Fifa e sem disputar uma Copa do Mundo desde 1998, a Áustria viu sua seleção evoluir nos últimos anos, principalmente com as introduções de Marko Arnautovic, David Alaba e Marcel Sabitzer. No entanto, o atual elenco austríaco está bem distante do histórico plantel dos anos 1930, que foi apelidado de “Wunderteam” (“Time Maravilha“, em português).

A lendária seleção da Áustria, que bateu de frente com diversos gigantes do continente europeu, começou a ser formada em meados de 1920 pelo ex-treinador Hugo Meisl (1881-1937), um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento do esporte em território austríaco. O ex-comandante, inclusive, idealizou as extintas Copa Mitropa e Copa Internacional da Europa Central, precursoras das atuais Liga dos Campeões e Eurocopa.

O “Wunderteam” austríaco teve muita influência do futebol britânico, berço do futebol e que na época era a principal autoridade da modalidade no mundo. Além disso, a excelente relação de Meisl com o ex-técnico inglês James “Jimmy” Hogan (1882-1974), uma das primeiras pessoas a introduzir táticas no esporte, trouxe muita inspiração para a formação da equipe da Áustria.

Meisl colocava sua equipe em campo no esquema tático 2-3-5, uma formação elaborada nos primórdios do futebol e que foi muito utilizada nos anos 1920 e 1930, tanto que serviu de inspiração para o chamado “futebol total”. A seleção austríaca se destacava por ter uma rápida troca de passes e jogadas muito efetivas, principalmente de seus meio-campistas e atacantes, sem esquecer da grande movimentação dos atletas no gramado.

Os conhecimentos de Meisl se encaixaram perfeitamente com a chegada de uma enorme quantidade de craques, como Josef Smistik, Walter Nausch, Josef Bican e, principalmente, Matthias Sindelar, o maior gênio da história do futebol da Áustria. A união de todos esses fatores possibilitou projetar os austríacos como uma das grandes potências do esporte.

O futebol ofensivo e criativo da Áustria auxiliou a seleção a conquistar com muita autoridade a temporada de 1931/32 da Copa Internacional da Europa Central. Liderados por Sindelar, também conhecido como “Der Papierene” (“Homem de Papel“, em português), os austríacos superaram rivais mais expressivos e faturaram o título em cima da poderosa Itália, que era comandada por Vittorio Pozzo. Além disso, o estilo de jogo do futebol da nação era tão eficaz que o time ficou 14 duelos invicto entre 1931 e 1932.

Antes da edição de 1934 da Copa do Mundo, a Áustria seguia protagonizando grandes façanhas pela Europa, como conseguir vitórias sobre as fortíssimas Suíça, Hungria e Alemanha, com destaque para a surpreendente goleada por 5 a 0 sobre a Escócia, que havia perdido pela primeira vez na história para uma rival de fora do Reino Unido. Os resultados aumentaram a fama da equipe de Meisl e a colocou como uma das favoritas para o título do Mundial da Itália.

Achando que a Áustria não era tudo isso que as pessoas estavam falando, a Inglaterra convidou a seleção rival para um amistoso em Londres, no Stamford Bridge. Os ingleses venceram por 4 a 3, mas foi por muito pouco que os comandados de Meisl não impuseram a primeira derrota do “English Team” em casa. Neste duelo, Sindelar recebeu a bola no meio de campo e driblou quase o time adversário inteiro para marcar um dos gols da sua equipe, feito que é equiparado ao antológico tento marcado por Diego Maradona na Copa de 1986.

Único Mundial disputado pelo “Wunderteam“, a Áustria chegou como uma das favoritas ao título da Copa do Mundo de 1934, na Itália. No torneio, que começou logo nas oitavas de final, os austríacos derrotaram na prorrogação a França pelo placar de três gols a dois e bateram a Hungria nas quartas por 2 a 1. Na semifinal, que seria diante da Azzurra, uma enorme chuva no dia anterior ao duelo deixou o campo totalmente enlameado e prejudicou o estilo de jogo veloz e técnico dos austríacos, que acabaram perdendo por 1 a 0.

Embora apresentando o melhor futebol da competição, a Áustria não conseguiu faturar a Copa do Mundo de 1934 e fechou a competição em um modesto quarto lugar, já que perdeu a disputa pela terceira posição para a Alemanha.

Após a fracassada tentativa de vencer o Mundial, o último ato do lendário “Wunderteam“, embora um pouco mais enfraquecido pela saída de várias peças, como Sindelar, foi nos Jogos Olímpicos de 1936, em Berlim. No entanto, a equipe, que na ocasião foi liderada por Hogan, perdeu  para a Itália na final e ficou com a medalha de prata na modalidade.

O futebol austríaco entrou em declínio pouquíssimo tempo depois da chegada do Nazismo, que quis colocar no elenco da seleção alemã as principais peças do “Wunderteam“. Além disso, muitos jogadores judeus passaram a ser expulsos de seus próprios clubes e perseguidos conforme o crescimento da ocupação nazista na Áustria, que foi completada em 1938. Mesmo classificado, o país não disputou a Copa do Mundo daquele ano por fazer parte do Terceiro Reich. A repentina morte de Meisl em 1937, após uma parada cardiorrespiratória, ajudou a mergulhar ainda mais o futebol local em uma profunda crise.

Na edição de 1938 do Mundial, que foi jogado na França, a Alemanha conseguiu convocar quatro jogadores que participaram da Copa do Mundo de 1934 pela Áustria: Josef StrohFranz WagnerWillibaud Schmaus Rudolf Raftl. Maior estrela do “Wunderteam“, Sindelar foi até chamado para jogar pelos alemães, mas recusou a proposta.

Além disso, Sindelar acabou sozinho com a seleção da Alemanha em um amistoso com a Áustria disputado pouco antes do “Wunderteam” ser desmantelado pelo regime nazista. A partida era para comemorar a anexação do país e os militares de Adolf Hitler ordenaram que os alemães vencessem o encontro. O ex-centroavante e seus companheiros de equipe não deram ouvidos e ganharam por 2 a 0, tanto que o “Mozart do futebol” marcou o primeiro gol e dançou na frente das tribunas onde estavam as principais autoridades do Terceiro Reich.

Após a dissolução da lendária equipe da Áustria, o país só foi ter novamente um elenco competitiva nos anos 1950, quando faturou um histórico terceiro lugar na Copa do Mundo de 1954, na Suíça, ao vencer o Uruguai por 3 a 1 em Zurique. No entanto, o “Wunderteam” ficará para sempre na história do futebol pela valentia, por quebrar barreiras e influenciar diversos grandes esquadrões.