Gattuso e Fiorentina: a relação que durou 23 dias

Durou pouco! Por meio de uma nota curta e constrangedora, a Fiorentina anunciou oficialmente, na manhã desta quinta-feira, que o “casamento” entre o clube e Gennaro Gattuso não terá continuidade. O treinador, portanto, não ficará em Florença para o início da próxima temporada. Seu contrato – já assinado – não será depositado na Liga Italiana, e a Viola já inicia a busca por um novo treinador.

Anunciado em 25 de maio, Gattuso ficou inacreditáveis 23 dias “à frente” da Fiorentina. No período, o ex-treinador do Napoli chegou a visitar as instalações do clube de Firenze, mas sequer conheceu o elenco, que ainda está de férias. Tampouco falou com o presidente Rocco Commisso. Quem o recebeu, no Centro de Treinamento foram Joe Barone e Daniele Pradè, diretores do clibe, e o filho de Commisso, Giuseppe.

No entanto, oficiamente, a Fiorentina não revelou os motivos que causaram o encerramento prévio desta relação. Nos bastidores, porém, é sabido que as rusgas tem relação com o empresário de Gattuso, o renomado português Jorge Mendes. Afinal, o que aconteceu em Florença nos últimos dias?

Briga pelo comando das contratações

Há poucos dias, o nome do meia português Sergio Oliveira, do Porto, foi vinculado com a Fiorentina. Aparentemente, o negócio ia bem – apesar de caro – e seria anunciado em breve pelos lados do Artemio Franchi. No entanto, não aconteceu. E o que reportam os veículos de imprensa locais é que a diretoria da Viola considerou os 20 milhões de euros pelo jogador, um valor alto de mais a ser pago.

Antes de chegar a esse ponto, porém, é preciso entender a atuação de Jorge Mendes. O empresário de Gattuso, naturalmente, começou a atuar em meio à diretoria da Fiorentina no momento do anúncio do treinador. O português, que agencia diversos jogadores de futebol, teria pedido uma comissão grande (cerca de 40 milhões de euros), para facilitar a chegada de 4 ou 5 jogadores a Florença.

Sergio Oliveira, assim como, Gonçalo Guedes (ambos portugueses, como Mendes) eram nomes cogitados. E o próprio Gattuso se escorava na promessa do clube em trazer reforços para que os negócios de seu empresário fossem levados adiante sem grandes contestações. O problema, contudo, é que a Fiorentina não trabalha dessa forma. Principalmente o diretor de futebol, Daniele Pradè.

Ao perceber que poderia se tornar refém de Jorge Mendes, Rocco Commisso pediu para que se interrompessem as tratativas relacionadas aos jogadores sugeridos pelo empresário. Com isso, Gattuso ficou furioso, e a relação entre treinador e clube estremeceu rapidamente. Antes, a TGR Rai Toscana revela que possíveis insultos à família de Commisso disparados por Mendes, em uma vídeo-chamada, certamente só pioraram toda a situação.

Opiniões se dividem

Entre torcedores da Fiorentina, encontramos as mais variadas opiniões. No geral, indignação com a diretoria, em especial Rocco Commisso, por mais este deslize em sua gestão. Muitos atribuem a ele a culpa por não aceitar as condições de Mendes e por fazer falsas promessas a Gattuso. Também questiona-se a intenção do ítalo-americano em, realmente, investir no elenco, já que o clube recusou os valores pedidos pelo agente português – nem tão altos assim, se pensarmos no que foi gasto em anos recentes. Ao mesmo tempo, o mandatário da Viola torra milhões com a constução do novo CT do clube, o Viola Park.

No entanto, há quem defenda a società por não se render às condições do empresário de Gattuso. Ora, a equipe não pode ser refém das escolhas de um homem de negócios, interessado nos ganhos financeiros de cada transação. É consenso, todavia, que este papelão é somente mais um indício da falta de profissionalismo da gestão de Rocco Comisso.

Amadorismo

De fato, é incompreensível que a diretoria da Fiorentina não tenha tomado conhecimento da situação entre Gattuso e Jorge Mendes – encontro que já se repetiu no passado, apesar de jamais ter se destacado nos holofotes italianos. O próprio Commisso defendeu a contratação do treinador italiano, apesar da resistênia interna existente. Será que ninguém avisou o presidente dos riscos deste casamento? Ou ele sabia e não quis ouvir?

O rompimento súbito nos indica que a Fiorentina, realmente, prometeu e não cumpriu algo à dupla Gattuso-Mendes. Situação deprimente, que somente agrega uma lista de patacoadas da diretoria violeta. É curioso, agora, rever as palavras do presidente da Viola no último dia 25 de maio. Sua declaração envelheceu rapidamente – e muito mal.

“Estou convencido de que Gattuso nos ajudará em nosso crescimento e que sua história profissional e humana representam para o clube uma importante garantia de determinação, competência e vontade de vencer […] Agradeço também à direção pelo trabalho em equipe e pelo abundante empenho que permitiu, a poucos dias do final da temporada, poder concluir um negócio tão importante para o futuro do nosso Clube ” – Rocco Commisso, presidente da Fiorentina

Futuro caótico

Agora, é impossível saber quais os próximos capítulos dessa novela envolvendo a Fiorentina. Aparentemente, a equipe já iniciou a busca por um novo técnico. Ou seja, voltamos a estaca zero. Diversos nomes são cogitados, como Claudio Ranieri e Paulo Fonseca. Diante dos fatos, é impossível fazer qualquer previsão racional

Entretanto, outros indícios de que a diretoria está completamente perdida vem a tona. É possível que Giancarlo Antognoni, lendário camisa 10 do clube, não tenha seu contrato renovado com a equipe par seguir na função de diretor. Caso isso aconteça, o ídolo será dispensado, pelas portas dos fundos, sem um tratamento, digamos, muito respeitoso por parte do clube.

A princípio, Antognoni recebeu uma oferta para trabalhar com a equipe juvenil, o que significaria um retrocesso em sua função junto ao clube. Em breve, Dario Dainelli, ex-jogador também, deixará o corpo de diretores. O que mostra certa bagunça na parte administrativa da Viola. Em meio à renúncia de Gattuso, a Fiorentina se desfaz de nomes importantes de sua gestão, enquanto outros não esclarecem os fatos.

O maior perigo, aqui, é a latente falta de credibilidade dos chefões da Viola. Quem aceitará embarcar neste “projeto” furado a partir de agora? Como ter certeza e garantias por parte de Commisso? A cada palavra do presidente que não se concretiza, sua imagem fica abalada – entre torcedores, inclusive. Cada vez mais, fica a impressão de que suas falas são meros protocolos: ricos em forma, mas vazios no conteúdo.

Distante de tudo, Rocco Commisso, atualmente nos Estados Unidos, segue calado – como de costume, quando as coisas dão errado. Diante desse cenário cirquense, a Fiorentina se transforma em uma piada à italiana. Desfecho injusto para uma instituição quase centenária e de tanta tradição nos gramados da Bota.