Um dos artigos de estratégia mais estudados nas universidades foi produzido há mais de sessenta anos mas ainda permanece relevante e influente para os gestores do século XXI. “Marketing Myopia” (Miopia em Marketig, em português) do professor de Harvard Theodore Levitt, apresenta um dos erros mais comuns das empresas em abordarem seus negócios.
Resumidamente a Miopia de Marketing é a perda de foco de uma empresa sobre o ramo em que atua, o que faz com que ela se atente mais na produção e venda de bens e serviços, ao invés de buscar identificar e satisfazer as necessidades e desejos dos consumidores. Esta espécie de “antolho empresarial” pode fazer com que aos poucos, o negócio perca relevância sem que os donos se deem conta. O artigo traz o exemplo das empresas ferroviárias que perderam espaço para caminhões, aviões, etc. por se considerarem uma empresa do ramo de ferrovias, ao invés de um empresa de transportes, ao “prestar atenção” apenas no produto que vendia e não no contexto em que estava inserido, o setor entrou em declínio.
Uma parceria que pode parecer incomum à primeira vista, porém, é um exemplo de entendimento desta teoria e da abrangência do que pode ser considerado o mercado esportivo… este é o envolvimento de Jay-Z com o futebol.
Jay-Z e seus negócios
Jay-Z foi o primeiro artista a ser considerado bilionário, segundo a revista Forbes. Além de mais de 70 nomeações ao Grammy Awards, vencendo o prêmio em vinte e duas oportunidades, o rapper estadunidense investe em empresas de diversos setores: moda, bebida, streaming, aviação, bolsa de valores (que inclui participação da Uber) e entretenimento.
Especificamente neste último ramo, em 2008 o cantor fundou a agência Roc Nation que atua dentre outras coisas, nas áreas de agenciamento de talentos, produção musical, desenvolvimento estratégico de marcas, moda, turnês. A empresa tem contrato com personalidades como Rihanna, Shakira, Lil Uzi Vert e J. Cole. E é partir das diversas atuações da empresa que os esportes entram em jogo.
Roc Nation entra no futebol
Além do setor musical a empresa tem um “braço” no setor esportivo com a agência Roc Nation Sports,que agencia atletasde futebol, basquete, futebol americano e de outros esportes em suas carreiras e utilização de marcas pessoais.
Especificamente no futebol a agência conta em seu portfólio com Kevin De Bruyne, Romelu Lukaku (foto abaixo) e Marcos Rashford, entre outros. No começo de 2020 inclusive, a agência com sedes em Nova York e Los Angeles, abriu um escritório em Londres para cuidar de perto de seus clientes e expandir ainda mais a lista de agenciados no país, que hoje conta com cinco atletas de futebol masculino e um de futebol feminino.
Em 2018 a empresa ficou entre as trinta agências esportivas mais valiosas do mundo pela revista Forbes com mais de US$ 960 milhões de dólares em contratos.
Miopia de marketing no futebol
Um dos maiores méritos e diferenciais da empresa é a forma como ela trata seus agenciados. A ideia pode ser resumida pelo começo da declaração do diretor de estratégia da Roc Nation Sports, ao falar sobre a atitude de Marcos Rashford. O jogador do Manchester United que tem contrato com a empresa influenciou o governo britânico a fornecer alimento à crianças de famílias carentes:
“Procuramos aquelas figuras que representam algo além do esporte que praticam. O que ele fez transcendeu a raça, transcendeu qualquer agitação social que estamos experimentando. Este é um rapaz de 22 anos que diz: ‘Nenhuma criança deve passar fome neste país. Isso é inaceitável”, declarou Kelly Hogart.
Assim como no exemplo de Levitt, a agência de Jay-Z não vê o futebol apenas como um esporte, mas sim como entretenimento; Rashford não é visto apenas como o atacante do Manchester United e da seleção inglesa, mas sim como uma personalidade que pode, por exemplo, estrelar a capa da revista de moda Vogue (foto abaixo) junto com ativistas de causas raciais, sociais, políticas e de saúde mental.
Parcerias com clubes: Milan e Leeds United
Já as primeiras parcerias da Roc Nation com clubes de futebol aconteceram recentemente, em julho e novembro do ano passado com o Milan (vídeo abaixo) e Leeds United. Com o acordo os clubes devem buscar aproveitar o conhecimento e a expertise da empresa de Jay-Z para expandir suas marca, ampliar atuação digital, criar colaborações de merchandising e aumentar receitas comerciais.
Com o projeto de revitalização do estádio San Siro já enviada à prefeitura de Milão (que deve explorar especialmente a venda de camarotes e ser sede de grandes shows) por exemplo, não seria de se estranhar que vários artistas agenciados pela Roc Nation se apresentem por lá nos próximos anos.
Assim como os concorrentes das empresas de ferrovia não eram apenas as outras empresas de ferrovia, parece cada vez mais claro que as equipes de futebol competem entre si apenas dentro de campo. Fora dele, os clubes disputam a atenção, disposição e dinheiro dos consumidores (pessoas que zapeiam os canais de televisão/celular em busca de algo interessante) com os setores televisivos, de cinema, streaming e até com redes sociais.
A junção entre clubes e jogadores de futebol e a Roc Nation, então, demonstra uma visão de longo prazo e esforços da dos envolvidos em desenvolver o lado do entretenimento ligado à suas marcas, como ressaltou Casper Stylsvig, diretor de receitas do Milan em entrevista à AP:
“Eu acho que a fusão entre esporte e entretenimento pode ser uma maneira de engajar novos torcedores. O mundo mudou drasticamente, e precisamos acompanhar. A Roc Nation está nos ajudando, nos desafiando com isso, é bom ter alguém ao nosso lado para fazer isso”.
Especificamente o Milan ainda deve explorar o aspecto da moda e estilo de vida por estar em situado um dos principais centros estilísticos da Europa, como também externou Stylsvig, mas desta vez em declaração ao site oficial do clube.
Muitas vezes a solução para um problema é uma bala de prata, neste caso aqui, parece que a Roc Nation Sports, clubes e jogadores pretendem utilizar de diversos utensílios que têm em suas mãos para alcançar algo grandioso.