Direitos de transmissão: a Europa segue “monopolizando” o espetáculo

O tema dos direitos de transmissão esportivas continuam quentes no esporte. Há muita coisa acontecendo na Europa, EUA e no Brasil. Cada vez mais se fala em presente e futuro, mas vamos ver que a grande maioria ainda mantém o pé firme no que alguns chamam de passado.

Direitos de transmissão são a maior fonte de receita do esporte mundial. É de onde vem o dinheiro, a exposição que gera receitas comerciais e o maior relacionamento com o torcedor. Ainda que as redes sociais venham ocupando um espaço importante nesse contato clube-torcedor, ainda é a transmissão esportiva ao vivo o carro-chefe do esporte.

Dando um passo in dietro, não se fala mais em “direitos de TV”, mas sim “direitos de transmissão”. Afinal, a plataforma é irrelevante neste momento em que há cada vez mais formas de conexão entre competição e torcedor. Portanto, se é TV aberta, fechada, streaming, rede social, tanto faz. O que importa não é o meio, mas o contato com o torcedor, ou fã.

No Brasil, onde a TV ainda é o grande veículo de relacionamento entre clubes, competições e torcedores, seja através da transmissão aberta, seja pela fechada ou pay-per-view em sistema de TV, há uma enorme divulgação da ideia de disrupção na forma de transmitir as partidas e competições. Seja através do modelo do Campeonato Carioca, ou da Copa do Nordeste, a ordem é espalhar a transmissão no maior número de plataformas possível para acessar o maior número de torcedores possível.

É uma ideia. O problema das ideias e da tentativa de emplacá-las é que por trás de algumas há uma série de agendas e interesses próprios. Sempre que alguém defender uma tese com tanta ênfase observe se a pessoa não faz parte de algum stakeholder que obterá vantagens com isso.

O risco das negociações descoordenadas e feitas em diversas plataformas é que você pode atingir mais pessoas, mas na pulverização o valor cai. E se o valor cai, é menos receita, mesmo que você tenha mais pessoas pagando menos. Afinal, quanto é esse menos? Sem contar que a questão de usar outras plataformas como “futuro” é tão clichê que até o Facebook recentemente resolveu repensar sua estratégia e deixou de competir pelos direitos de transmissões esportivas, focando em outros conteúdos ligados ao esporte.

Tanto faz se você faz a transmissão pelo TikTok, pelo Twitch ou pela TV Aberta. No fim, o que importa é quanto você monetiza dessa relação. E quanto mais você invade um campo que não é seu habitat natural, maior a chance de ser engolido.
Segundo matéria recente do Globoesporte.com, o Campeonato Carioca da atual temporada está sofrendo enorme impacto das transmissões piratas via redes sociais, sites e Youtube. Mesmo com o trabalho dedicado a evitar este tipo de crime, ainda assim parece ser como enxugar gelo. Outro aspecto de risco na hora de fazer conta de retorno.

OS NEGÓCIOS NA EUROPA

No Brasil as agendas acabam reforçando a ideia de que temos um monopólio que precisa ser quebrado, e que as negociações diretas são o grande trunfo para isso. Pode ser, até porque o modelo atual de negociações da principal competição nacional não é bom. Mas mesmo num modelo ruim há dois meios transmitindo a Série A (Globo e TNT Sports). No Campeonato Carioca há um modelo com vendas diretas, PPV de TV Fechada, TV Aberta. A Copa do Nordeste há anos é transmitida pelo SBT e pela LiveMode, que também distribui numa série de outros meios. Meios diferentes distribuídos pela mesma empresa.

A Conmebol tem um modelo de negociação das competições, separando por pacotes, que é o modelo Europeu. Falando nele, vamos atualizar algumas informações.

Na semana passada foi definido um novo contrato de direitos de transmissão da Serie A italiana. Depois de quase 20 anos de relacionamento da liga com a Sky, quem conquistou o principal pacote foi DAZN, distribuidora de conteúdo via streaming, num acordo com a operadora de telefonia TIM.

Curiosamente, a competição direta foi a com Sky/Eleven, e enquanto a DAZN oferecia um valor maior e a transmissão via plataforma de streaming, o competidor tinha como apelo o desenvolvimento de um canal próprio da liga a partir da Eleven. Tudo que os agentes no Brasil defendem. No final, vendeu a proposta de maior valor do DAZN. Não importa o meio.

Note que na Itália a DAZN pagou um valor relevante para ter todas as partidas, sendo 7 com exclusividade – ou o que algumas pessoas no Brasil chamariam de “monopólio” – enquanto na Alemanha há uma divisão entre Sky e DAZN, mas onde cada operador atua com exclusividade em determinados dias da semana.

Na Inglaterra é a mesma coisa: divisão entre 3 operadoras e cada um oferece partidas exclusivas. Não é monopólio, é exclusividade. Nos últimos meses a UEFA renovou os contratos de direitos de transmissão de suas competições para os próximos 3 anos.

Veja como na Espanha e no Reino Unido haverá exclusividade – não monopólio – o que fez com que o preço de negociação aumentasse. Nos demais países foram negociados pacotes por dia (16 partidas na Terça, 16 partidas na Quarta e um terceiro com todas as partidas restantes), de forma a ter competição e aumentar o preço.

Negociação da competição, mais que o excesso de exposição, é que gera valor ao negócio. Mesmo assim, nas competições nacionais a renovação atual tem redução de valores nos direitos domésticos entre 5% e 10%, queda que deve impactar também a Premier League na renovação para a temporada 22/23.

O fato é que testar formas e formatos é interessante e necessário. Mas a busca pelo torcedor espalhado pelos diversos meios de entretenimento que existem hoje pode ser apenas um caminho rumo à confusão na oferta. Por mais que os clubes europeus pensem na produção e venda de conteúdo, a realidade é que este conteúdo é adicional às partidas, é complementar ao jogo. E a negociação das competições é muito mais eficiente quando feita de forma coordenada, mesmo que isso signifique exclusividade.

Os direitos de transmissão perderão valor. O futebol precisará buscar novas fontes de receita, precisará ser criativo, vender highlights, ocupar espaços. Há que ter cuidado com a gestão do novo. A vantagem de não ser pioneiro é evitar os custos e erros de quem saiu na frente. Existe um caminho óbvio e a partir dele uma série de possibilidades. Só tenha cuidado se alguém tentar te vender a roupa nova do rei.