O que a derrota para o Milan ensina a Fiorentina?

Na tarde de ontem (21), a Fiorentina não conseguiu quebrar a escrita recente diante do Milan no Artemio Franchi. Em um jogo movimentado, até teve a liderança no placar, mas sucumbiu na parte final do 2º tempo. Derrota por 3 a 2, e a quinta partida em casa seguida sem vencer o rival rossonero.

Se o resultado foi ruim, tanto em termos do jogo em si, quanto da classificação, o futebol apresentado pela Viola foi um pouco mais satisfatório, se comparado a rodadas anteriores. A partida, como um todo, foi agradável de ver, e certamente quem escolheu assistí-la nesse domingão não se arrependeu.

Novamente, a equipe de Cesare Prandelli levou a virada na 2ª etapa. Dessa vez, não conseguiu um empate milagroso, como contra o Parma. No entanto, alguns componentes novos vistos em campo deixam mais perguntas que respostas na cabeça dos torcedores. Afinal, o que a derrota para o Milan ensina a Fiorentina? Vamos aos fatos.

Retorno ao 4-4-2

Prandelli promoveu uma mudança tática logo de cara. Sem Biraghi ou Barreca pela ala-esquerda, o treinador da Viola optou por utilizar uma linha de 4 atrás. Martín Cáceres fez a função de lateral-esquerdo, e pelo outro lado Lucas Martínez Quarta compôs a escalação. Venuti, titular na posição nos últimos duelos, ficou no banco. E talvez fosse melhor se por lá tivesse permanecido. Já explico…

O intuito, certamente, foi proteger um pouco melhor os flancos das investidas em velocidade do Milan. Martínez Quarta e Cáceres são dois laterais bem defensivos, apesar de se aventurarem no ataque de vez em quando. Mas, sem dúvidas, protegem mais a defesa do que Venuti ou Malcuit.

Sem o brasileiro Igor Julio, ainda machucado, a zaga não teve alterações: Nikola Milenkovic e Germán Pezzella. Junto do goleiro Dragowski, também entraram como titulares: Pulgar, Bonaventura, Eysseric e Castrovilli, no meio, além de Ribéry e Vlahovic, mais à frente.

Boa postura, mas os espaços…

A Fiorentina foi a campo com um desenho tático muito claro. Duas linhas de 4, com Castrovilli pela meia-esquerda, e Eysseric do outro lado. À frente, Ribéry com liberdade para flutuar pelo campo todo, e Vlahovic na referência. O time apresentou uma energia boa ao longo de todo o 1º tempo, sem deixar o Milan dominar completamente as ações.

Ainda assim, a Viola concedeu muitos espaços entre as duas primeiras linhas. Ora, com apenas dois zagueiros, é necessário realizar uma movimentação diferente e estabelecer um diálogo preciso com os volantes. Senão, as lacunas vão aparece (como apareceram). Logo aos 9 minutos, Ibrahimovic aproveitou uma delas e foi lançado em profundidade.

Não era um contra-ataque, tão pouco uma roubada no campo de ataque. O Milan rodava a bola, quando, de repente, o zagueiro Kjaer acionou o sueco, sozinho, de frente para o crime. Gol do Milan. A partir daí, podemos dizer que o time até melhorou nesse quesito em geral. Talvez tenha dado tempo de assimilar.

Vale lembrar que, ao longo do jogo passado, contra o Benevento, Prandelli variou o sistema de jogo. Sem a bola, com a bola, já com a vantagem no placar. No confronto deste domingo, não. Desde o início, o time já se armou com a linha de 4 atrás. 

Alguns espaços ainda surgiram durante o 1º tempo. surgiram. Ibrahimovic acertou o travessão, e Çalhanoglu por pouco não marcou em chute de fora da área. Entretanto, a equipe violeta se manteve disciplinada em seu esquema de jogo. Quase não desfez as duas linhas enquanto esteve sem a bola.

A bola parada

Ofensivamente, a Fiorentina apresentou um volume interessante. Nos primeiros 30 minutos, já colecionava cinco escanteios. Foram seis ao longo da primeira etapa, sendo cinco deles pelo lado esquerdo. Castrovilli, jogando aberto por ali, incomodava bastante o lateral-direito do Milan, Dalot. Sabendo de suas limitações, a Viola não se envergonhou em buscar os tiros de canto. E quase marcou em dois deles.

Se o gol não veio em uma cobrança de escanteio, ele chegou através de uma falta. O chileno Erick Pulgar bateu com precisão, de uma posição difícil, no canto da área. Donnarumma até desviou, mas não conseguiu evitar o gol. A presença de Pulgar no time titular pode ser justificada por conta de lances como esse. O camisa 78, que completou 50 jogos como titular diante do Milan, é um especialista na bola parada.

Contra o Parma, no jogo anterior no Artemio Franchi, também foi importante em dois gols da Fiorentina que se originaram, justamente desse tipo de jogada. No todo, não acho ele melhor que Amrabat, que vinha sendo titular até se machucar. O marroquino é mais físico e tem um passe melhor, mas não conseguiu ser um fator desequilibrante em nenhum duelo. Portanto, nesse momento, a Viola precisa de Pulgar.

“Mas só por causa da bola parada?” Pode parecer pouco, mas em um time que briga na parte debaixo da tabela, tal artifício representa pontos a mais. A entrada do chileno não significa, necessariamente, a saída de Amrabat. Quando o marroquino voltar, Prandelli pode testar os dois juntos no meio de campo.

A trajetória do chileno foi cheia de percalços nessa temporada. Após marcar sete gols em 2019-20, ele tinha tudo para se manter titular ao longo dos últimos doze meses. No entanto, acabou se contaminando com a Covid-19. Quando retornou, não conseguiu jogar bem e acabou ficando de fora de muitas partidas. Nesse momento, ele se assemelha com o jogador que foi na última temporada.

O volante tem pontos fracos, claro. Às vezes vacila na defesa – contra o Milan, por exemplo, deu uma pixotada que gerou um contra-ataque do adversário. Ainda assim, pode ser importante daqui para frente justamente pela contriubuição gerada a partir de seu pé direito preciso.

Mantenha-se à estratégia!

No 2º tempo, a Viola conseguiu fazer algo raro na temporada: voltar melhor do vestiário. Logo aos cinco minutos, Ribéry virou o jogo em uma jogada bastante virtuosa de Vlahovic. Não tem muito tempo, critiquei ele aqui por falhar muito nas tentativas de “fazer o pivô”. Mas já é o segundo jogo que o sérvio participa de gols utilizando o recurso. Em seu terceiro diante do Benevento e neste último duelo, no gol de Franck Ribéry.

A remontada da Viola foi merecida. O time jogava bem até aquele momento, conseguindo incomodar o Milan e impedindo o rival de dominar o próprio campo de ataque – algo que faltou a poucas rodadas contra a Inter, por exemplo. Entretanto, após conseguir a vantagem, a Fiorentina desapareceu do Artemio Franchi!

Não finalizou mais, perdeu a intensidade na marcação e, pasmem… começou a se desorganizar em campo. Por que fazer isso com a liderança no placar? Acho que nem os jogadores sabem responder. Fato é que as linhas de 4 começaram a ficar imperfeitas. E era óvio que o Milan viria para cima em busca da vitória. A equipe rossonera ainda pode pensar em título da Serie A, por que não?

Chamo a atenção para a ORIGEM do gol de empate do Milan. Era escanteio para a Viola. Como de praxe, os zagueiros foram para a área. Até aí, tudo bem. Só que não teve proteção na retaguarda, como aconteceu, por exemplo, nos inúmeros tiros de canto no 1º tempo. Com a vantagem no marcador, era ainda mais natural que houvesse preocupação com o contragolpe adversário. Não houve.

Após a batida, o Milan escapou em velocidade, e a Viola precisou correr atrás. O resultado foi um escanteio do outro lado. Nele, o empate dos visitantes aconteceu, em mais uma falha na bola área nesta temporada. Já está repetitivo dizer… A partir do 2 a 2, o cenário piorou. A Fiorentina partiu para cima e bagunçou ainda mais o campo. O jogo virou um tiroteio. E, nessa, o Milan sobrou na parte técnica e física.

Prandelli tentou retornar para o 3-5-2 aos 25 da segunda etapa. Tirou Castrovilli (opção BEM questionável) e colocou Venuti, o cara que eu disse antes que não devia ter entrado. Isso porque, nem um minuto após pisar no gramado, o Milan achou espaço onde ele, Venuti, deveria estar. Gol de Çalhanoglu e revirada no Artemio Franchi.

Agora pare para pensar. A Fiorentina precisou se adaptar DUAS vezes ao sistema tático em um jogo. Tanto no início, ao começar com o 4-4-2 não usual, e depois, quando Prandelli decidiu retornar com os três zagueiros. Não à toa, a equipe sofreu dois gols nessas “fases de transição”. E isso é muito preocupante. Os jogadores não podem ser submetidos a tantas alterações bruscas e repentinas.

O plano inicial deu certo, apesar do gol sofrido no início. Por que não mantê-lo? Acho que falta mais treino e entrosamento, mas certamente é algo que também tem o dedo do treinador.

Bombardeio aéreo!

Mais uma vez, a Fiorentina levou um gol a partir de um cruzamento. Como contra o Torino, a Udinese e o Benvento na última rodada. É inadimissível que um time que conta com Pezzella, Milenkovic, Martinez Quarta e Cáceres sofra tanto nesse quesito. Não é um problema técnico. É de posicionamento.

Todos esses citados já deixaram suas marcas OFENSIVAMENTE. É um grupo que marca gols e ajuda a Viola na frente. O que acontece lá atrás? Prandelli precisa encontrar uma saída para esse problema. Sem dúvidas, o time violeta estaria em uma situação mais favorável se não levasse tantos gols… de bobeira.

Um meia no lugar dos alas

Sinceramente, gostei da produção ofensiva. Muito concentrada em escanteios e contando com um gol de falta, é verdade. Ainda assim, é possível perceber que a adição de mais um meia e a retirada dos dois alas se mostrou algo benéfico para a Fiorentina. Ribéry fica mais solto, Castrovilli e Bonaventura chegam um pouco mais à frente. E, quem diria, Eysseric vem desempenhando um bom papel pelo lado direito.

Eu vejo neste 4-4-2, com uma linha de 4 ou o famoso losango no meio, uma possibilidade a ser explorada por Prandelli. Corrigindo os erros defensivos, este sistema se mostra mais compatível com a característica do elenvo Viola. Até Vlahovic passa a ser mais acionado, deixando de ficar preso numa “ilha” lá na frente.

Apesar do placar adverso, creio que esse jogo possa “ensinar” a comissão técnica uma nova forma de entender o sistema do time. Vamos ver se foi apenas uma saída provisória por conta dos desfalques ou se Prandelli pensa em dar continuidade a esse desenho nas próximas rodadas.

E a receita?

Infelizmente, não há uma receita. Elenquei ao longo do texto alguns dos aspectos que PODEM ser determinantes daqui em diante na temporada. Mas não pretendo ser adivinho ou dono da verdade.

Fato é que a Fiorentina precisa sanar o problema crônico nas bolas aéreas defensivas, ao mesmo tempo que deve potencializá-las no ataque – Pulgar é a peça que permite isso. Com relação ao desenvolvimento do jogo, acho importante trabalhar as situações adversas. A equipe claramente se desespera em alguns momentos, abandonando a ideia original. Tudo é uma questão de entender o contexto da partida.

Na hora que estava 2 a 2, com dez minutos restantes, Milenkovic foi para a área no meio de uma jogada tentar o gol de cabeça, abandonando completamente sua posição. Desespero é tudo que a Fiorentina NÃO precisa neste momento. O final da Serie A não será fácil. O time se manteve com 29 pontos, na 14ª colocação, mas viu Spezia e Benevento vencerem na rodada e empatarem em pontos. Um ponto diante do vice-líder Milan seria muito bem-vindo. Paciência…

O próximo confronto é direto: contra o Genoa, 13º na tabela, no dia 3 de abril. Se corrigir ao menos parte das deficiências, a Viola tem totais condições de capitalizar suas virtudes e voltar de Gênova não só com uma boa atuação, mas com um resultado concreto também.